Ninguém é de Ninguém é um suspense dramático brasileiro, baseado no livro homônimo de Zíbia Gasparetto e possui a temática do espiritismo. Nada que o diretor e roteirista Wagner de Assis não esteja acostumado. Diretor de Nosso Lar, Kardec. A Cartomante, entre outros, Wagner constituiu sua boa carreira com longas com essa temática, tem a sua produtora, a Cinética Filmes (que também produziu este aqui) e faz um trabalho muito consistente aqui, embora com algumas diferenças da obra de Zíbia.
O filme já começa com Roberto (Danton Mello) tomando golpe de seu antigo sócio e ficando financeiramente quebrado. Ele morre de ciúme de sua esposa, Gabriela (Carol Castro), que tem a sua carreira, um cargo de confiança, mas seu marido não quer que ela trabalhe, pois, segundo ele, “a função da mulher é cuidar do lar”.
Gabriela trabalha na empresa do Dr. Renato (Rocco Pitanga), que também está infeliz com o seu casamento, pois sua esposa Gioconda (Paloma Bernardi) é possessiva, também morre de ciúmes e tanto ela quanto Roberto suspeitam de que seus cônjuges estejam tendo um caso. Eles levam a suspeita até o final e vai trazer consequências trágicas a todos em volta.
O longa funciona para quem conhece e para quem não conhece o livro original, foi respeitoso com o trabalho da Zíbia e as duas mídias podem coexistir, mas quem não conhece o livro não tem o que se preocupar, porque o roteiro toma muitas liberdades, atualiza para os novos tempos, seja pelos costumes e pelas tecnologias e quase dá para falar que são duas obras distintas.
O perfil psicológico de quase todos os personagens foi mantido: Gabriela é inteligente, independente e fiel, Renato é um empresário e pai de boas intenções e Gioconda não é mentalmente equilibrada, mas Roberto foi o personagem que mais sofreu alterações. OK, ele é possessivo e ciumento nas duas mídias, mas, no livro, há toda uma construção para mostrar suas motivações e de como ele é fruto do seu meio.
Por conta disso, dois personagens fundamentais do livro, Dr. Aurélio, psicólogo de Roberto e dona Georgina, mãe dele, inexistem no filme.
Os fãs da Zíbia podem reclamar, mas foi uma escolha do diretor para transformar o Roberto em um personagem detestável, pois muitas das consequências apresentadas aqui são causadas por ele e não bastasse isso, é abusivo e violento com a sua esposa.
O roteiro ainda tem espaço para discutir assuntos como obsessão pela outra pessoa, o lugar da mulher no mercado de trabalho e até fake news (praticamente tudo é causado por notícias falsas), muito bem organizado em um longa que começa como um thriller, um suspense dramático, mas que depois assume o lado do espiritismo e do sobrenatural.
O espectador provavelmente não vai reclamar das mudanças do longa, já que ela acontece de forma natural, fluida e além dos temas atuais, ainda abre a discussão para um mundo além do nosso, o livre arbítrio, se as nossas ações são fruto de vidas passadas e de espíritos que vagueiam pelo planeta, mas sem levantar a bandeira para nenhuma ideologia.
Tudo isso muito bem orquestrado por Wagner de Assis, com ótimas performances do quarteto protagonista – além de outros do elenco – e temos um longa muito interessante e mesmo não sendo o melhor longa do diretor (Nosso Lar acaba tendo um saldo mais positivo), dá orgulho para nós brasileiros, que o cinema nacional esteja se arriscando em outros gêneros, sem contar a produção caprichada na segunda metade ao mostrar o mundo nosso junto com o dos espíritos.
Ninguém é de Ninguém pode se tornar um jovem clássico do cinema brasileiro, querido por muitos, um ótimo estudo de personagens e que dificilmente o espectador sairá da sessão da mesma forma que entrou.
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