A única coisa ruim deste filme é seu subtítulo desnecessário: ‘O Confidente da Rainha’ dá uma ideia errada sobre o que o filme realmente é; um belo retrato sobre o fim da era vitoriana, uma história sobre o preconceito e intolerância de todos nós e uma boa forma de conhecer este período da História.
Judi Dench novamente interpreta a Rainha Vitória. Ela já interpretou essa figura histórica em Sua Majestade, Mrs. Brown, em 1997, foi indicada ao Oscar (e injustamente perdeu para Helen Hunt), que aqui já está no fim de sua vida, já entediada após um longo reinado. Neste meio tempo, dois jovens indianos são convocados a entregar uma moeda local, mas que um deles, Abdul, acaba por criar uma improvável amizade com a Rainha, o que gera o desconforto e preconceito da corte, e daí nasce uma relação quase de mãe e filho.
Apesar de Victoria e Abdul ser um belo retrato de uma época controversa da história, este é um longa que não se preocupa em ser uma aula de história. É um filme e não um documentário. Logo no início já deixam claro que nem tudo visto em tela é verdade. Os personagens são reais, a história realmente aconteceu, Abdul foi praticamente humilhado pela corte britânica, sua vida real foi revirada, tentaram o possível e o impossível para desfazer a amizade, manipular a rainha contra seu novo amigo mas foi tudo em vão. O que os membros da Corte não engolem é o fato de terem uma pessoa de uma classe social supostamente inferior e de uma então colônia inglesa (a Índia conquistou sua independência em 1947) ali junto com eles sendo tratado como todos deveriam ser: com humanidade e respeito. As coisas seriam muitos mais fáceis se todos tivessem tratado-o bem e sem a arrogância humana para criar rótulos. E se hoje em dia há um clima de intolerância e preconceito, imagina na época e no país que, na ocasião, era potência mundial. E o nosso Abdul não faz nada de mais exceto ser ele mesmo, tratando a Vitória não como Rainha, mas como uma amiga, sem as formalidades da monarquia. E toda hora deve provar seu valor e, mesmo sem querer, se superar. É como diz uma frase da série Scandal: ‘você deve ser duas vezes melhor do que eles para conseguir metade do que eles têm.’ Mas engana-se quem acha que Victoria e Abdul seja um filme maniqueísta: Abdul não é herói e muito menos a Corte é vilã, são apenas humanos. Victoria e Abdul já surge como forte candidato a vários Oscars mas engana-se quem acha que está é um “filme de Oscar”: não é previsível, por diversos momentos serve até como um produto de entretenimento, e pode fazer com que o espectador se interesse pela literatura vitoriana ou filmes como o próprio Sua Majestade ou A Jovem Rainha Vitória, com Emily Blunt.
Judi Dench arrebenta mais uma vez, deve ir às premiações em 2018 ao fazer uma rainha cansada e já preocupada com seu legado, porém, com mais humanidade do que seus súditos. É bacana fazer um estudo do fim da vida da Rainha Vitória com base neste filme aqui. Ali Fazal é tão bom quanto Judi como Abdul, tem praticamente o mesmo tempo de tela que ela, mas que deve ir para as premiações nas categorias de ator coadjuvante como estratégia. Stephen Frears mostra porque é um grande diretor – ele sabe lidar com fatos históricos e faz uma ótima condução de atores, como visto em A Rainha, Philomena (este último, também com Judi Dench) e em muitos outros trabalhos. Aqui ele faz um trabalho maduro, de gente grande, mas que pode divertir, ensinar e fazer com que seu público pense sobretudo em seus atos. Se as indicações ao Oscar vierem – e é merecedor para as categorias de Filme, Diretor, Atriz, Ator Coadjuvante, Roteiro Adaptado, Figurino, Direção de Arte e Trilha Sonora – será algo positivo não apenas pelos méritos do filme, mas também para fazer com que o filme ganhe notoriedade e o grande público o descubra e veja uma grande história. Deus salve a Rainha!
Nota: 5 estrelas