Não é novidade que existam filmes que são ignorados na ocasião do lançamento e se tornam cultuados com o tempo – como Blade Runner e Clube da Luta –, mas o caso de Cidade das Sombras é ainda mais implacável: a obra foi um fracasso de bilheteria, nem no home video se recuperou e mesmo agora, 20 anos depois de seu lançamento, poucos sabem de sua existência.
Cidade das Sombras foi lançado em 1998, um ano antes de Matrix e as comparações são inevitáveis: a fotografia escura e em tons de verde, a visão pessimista do futuro e a direção de arte dos dois filmes feita pela mesma pessoa: Michelle McGahey.
Não que Matrix tenha copiado Cidade das Sombras. Houve sim, uma clara influência, mas dá para apreciar as duas obras sem comparações ou fanatismo.
Cidade das Sombras se passa num futuro onde a luz do dia não existe mais, sempre quando o relógio bate meia-noite, as pessoas adormecem, pois alienígenas manipulam o tempo, a mente e a vida delas. John Murdoch, é o único na cidade que não foi afetado pela paralisação do tempo e é perseguido pelos alienígenas.
John começa o filme desnorteado, desmemoriado e acorda ao lado do cadáver de uma mulher, depois descobre-se que ele é o principal suspeito do assassinato de várias mulheres.
Murdoch recebe a ajuda do Dr. Daniel Schreber, um psiquiatra com intenções duvidosas. Paralelamente a isso, Frank, o inspetor de polícia da cidade está em sua cola e sua esposa, Emma, não sabe o que fazer com a falta de memória de seu amigo e a pressão de todos para encontrá-lo.
Nem mesmo o elenco de peso e o diretor trouxeram público ao filme: Rufus Sewell, Kiefer Sutherland, Jennifer Connelly, William Hurt e Melissa George, em início de carreira, estão ótimos em seus papéis, com destaque para Rufus, como John Murdoch e Kiefer como o psiquiatra.
O diretor, Alex Proyas, que também assina o roteiro deste filme, começou a carreira muito bem em filmes como este, O Corvo e Eu, Robô, mas que anos depois dirigiu o estranho Presságio e a bomba Deuses do Egito.
O roteiro de Proyas usa a metáfora da vida alienígena para fazer crítica à nossa cultura, como manipulação das informações, conspiração e controle das massas: nada é o que parece ser e até a última tomada, nada é previsível aqui.
Há um bom uso de efeitos práticos na maior parte do tempo, embora alguns efeitos digitais tenham envelhecido mal e este é um filme quase autoral de Proyas, mas com um orçamento até que alto para a época (27 milhões de dólares) e por alguns momentos ele não se decidiu se queria um filme para o grande público ou para um nicho.
Uma segunda voz, opinião, poderiam resolver isso.
Mas, apesar dessas ressalvas, Cidade das Sombras permanece como uma obra a ser descoberta e que inspira muito do que vemos hoje.
Dos 27 milhões gastos, faturou os mesmos 27 nas bilheterias mundiais. Uma pena.
O filme tem 74% de aprovação no Rotten Tomatoes, mas o que vale é o legado e influência para uma geração de cineastas que viriam a seguir. O clima noir, com elementos de cyberpunk, mas com steampunk tornam este filme quase que obrigatório.
O que falta para a Netflix colocá-lo em seu catálogo para que uma geração o descubra?