Muita gente pode não valorizar, mas o cinema brasileiro sabe contar grandes histórias, fazer grandes filmes e que também sejam bons tecnicamente. Exagero? Basta olhar para filmes como Cidade de Deus, que recebeu indicações técnicas ao Oscar, ou para Tropa de Elite, Central do Brasil e o recente O Rastro.
E agora, em 2018, chega aos cinemas um filme que é tão bom – ou melhor – tecnicamente do que muitos blockbusters vencedores de Oscar. Também achou exagero? Então é melhor você descobrir Motorrad.
Motorrad é baseado nos personagens do quadrinista Danilo Beyruth e conta a história de Hugo, um jovem que deseja participar do grupo de motocross de seu irmão mais velho, e, para isso, decide roubar algumas peças de moto, mas não demora muito para ser descoberto. Hugo é salvo por uma moça misteriosa e consegue sair com o grupo de seu irmão em uma aventura, mas que não necessariamente será benéfica para o grupo.
Tecnicamente, Motorrad é mais do que perfeito: a fotografia, com cores frias e vibrantes, dá o tom de thriller e suspense que o filme exige. É muito do mérito do roteiro e da direção do Vicente Amorim, mas, sem uma boa direção de fotografia, não teria o mesmo impacto.
Também a montagem rápida, frenética e precisa é quase um personagem do filme: não perde nada para algumas montagens vencedoras de Oscar, como a do Whiplash ou O Ultimato Bourne, por exemplo.
Até mesmo a Mixagem e Edição de Som são um grande detalhe aqui: tudo foi pensado e organizado, desde o som das motos até a respiração dos personagens. O clima tenso de Motorrad também deve muito à parte sonora.
Mas o filme vai além da técnica: a narrativa de Motorrad também é muito peculiar e deu muito certo: não há diálogos nos primeiros 10 minutos de projeção. Já começamos com o nosso protagonista entrando em uma oficina mecânica, claramente tenso, onde é pego pelo dono, mas salvo pela moça misteriosa.
Só vemos diálogo a partir das aventuras do grupo. O roteiro deixa mais dúvidas do que respostas, isso é ótimo para manter o clima de mistério em relação aos personagens, mas pode incomodar alguns, sem contar que o terceiro ato é tão acelerado que pode frustrar os mais desavisados. Mas isso não impede que o público se envolva emocionalmente com os personagens: Hugo é aquele jovem cheio de sonhos e que deseja ser alguém na vida. Quem não conhece alguém assim? E no grupo dos motoqueiros há diversos tipos, mas, que jamais são estereotipados: temos o mais descolado, o galã, a mocinha e o menos popular.
Neste contexto, quem se sai melhor é a personagem da Carla Salle, que seu nome jamais é revelado e ela mesma tem poucos diálogos. Quem é ela? O que quer com o grupo? Quais suas reais intenções? Ela foi mandada pelo grupo de vilões?
E por falar no grupo de vilões, quem são eles realmente e o que eles querem?
Dá muita vontade de saber mais sobre eles e os próprios realizadores do filme pretendem explorar mais os personagens e esse universo, mas que dependem do sucesso comercial deste filme.
Houve uma boa divulgação durante a CCXP no painel da Warner, junto com arrasa-quarteirões como Tomb Raider e Jogador Número 1, próximos lançamentos do estúdio. Já na mídia tradicional, próximo do lançamento, o marketing está mais tímido e é difícil prever se o público geral vai abraçar ou ao menos conhecer o filme.
É pouco para quem almeja uma continuação ou franquia. Um filme não precisa de bilheteria para provar sua qualidade, isso é fato, mas a indústria precisa de sucesso e acolhida popular para o chamado cinema de gênero crescer.
Ainda há um longo caminho pela frente.