Bandida – A Número Um é um filme brasileiro, com lançamento nos cinemas em junho de 2024, é baseado no livro homônimo de Raquel de Oliveira, e também baseado na história real de Rebeca (Maria Bomani, excelente no papel), uma jovem nascida na favela da Rocinha, que, depois de uma infância difícil pela condição financeira, sua mãe era doméstica que dormia no serviço, foi vendida por sua avó ao dono da favela, o Amoroso (Milhem Cortaz, igualmente ótimo), sendo tratada como um produto, mas que foi tomando as rédeas do negócio, ganhou respeito dos moradores e se tornou a líder da comunidade.
O filme é dirigido e escrito por João Wainer, que tem poucos trabalhos, mas este é o seu filme mais desafiante. É um trabalho que resgata uma tradição que ficou esquecida com o passar dos anos e o sucesso das comédias, mas que traz de volta ao mainstream os filmes que mostram uma outra realidade que a mídia e o poder público às vezes fingem que não existem, ou os “filmes-favela”, como são mais conhecidos.
O longa gera curiosidade pelo seu tema e por se tratar de uma história real. É a história da Rebeca sim, mas também é a história da Rocinha e, porque não dizer, do Rio de Janeiro como um todo.
E tudo isso pelo ponto de vista feminino, o que gera ainda mais curiosidade.
As comparações com Cidade de Deus são inevitáveis, mas se o filme do Fernando Meirelles mostra o nascimento do crime organizado nas comunidades, este aqui mostra tudo de forma consolidada, como um negócio e porque isso é, infelizmente, do interesse de muita gente que continue.
Sem contar que o longa mostra a realidade de muitas meninas que acabam sendo vendidas pela família e que, infelizmente, não têm escolhas.
Pode dar gatilhos para quem é mais sensível. Aliás, este é um filme muito violento e a produção foi feliz em não suavizar o que se vê em tela.
Os realizadores tiveram poucos recursos para fazer o filme, mas isso não impediu de fazerem um grande trabalho e contornar o baixo orçamento com uma grande história, poucos atores conhecidos do grande público (Milhem Cortaz e Natália Lage são mais conhecidos de todos) e a produção não deu um passo maior do que a perna na concepção do todo.
Mas isso não impede de o filme ter grandes cenas: há boas cenas de ação e o destaque fica para a sequência de abertura, com um tiroteio violento, mas com a narração em off da protagonista (que é a narradora da trama) ao som de Deslizes, do Raimundo Fagner – sim, uma música lenta com um tiroteio e o resultado ficou incrível.
A história é dividida em capítulos (provavelmente, seguindo o fluxo do livro) e o elenco está afiadíssimo: desde os nomes conhecidos como Milhem Cortaz e Natália Lage, até a nomes menos conhecidos, como Jean Amorim, que interpreta o Pará, interesse amoroso da protagonista e a química do casal é inevitável.
Mas quem brilha é Maria Bomani, que abraçou o protagonismo, abraçou a personagem e faz uma performance sublime, em que o público entenda o seu ponto de vista, mesmo fazendo uma pessoa que ganhou a vida no crime. Não parece, mas é difícil criar empatia com o público, mas a atuação de Maria é um ponto alto na história e não há de duvidar de ganhar vários prêmios pelo papel.
O roteiro só perde a mão no terço final, já que a história se torna muito resumida e ficou a impressão de que os realizadores quiseram encerrar do jeito que estava mesmo. Uns 10 minutos a mais com um bom trabalho de montagem seria mais do que perfeito.
Bandida – A Número Um é cinema de guerrilha, feito na raça, com uma excelente protagonista, elenco competente e que merece ser descoberto.
É o cinema também como espelho da realidade.