“Você terá pessoas fazendo escolhas por você durante toda sua vida. Acostume-se com isso.”
Por quase toda a história da humanidade, as mulheres foram obrigadas a revogarem de suas escolhas e tomadas de decisões. A calarem suas vozes. Seguirem os caminhos que uma sociedade machista e conservadora, dizia pertencer-lhes – ofuscadas e sob o domínio dos homens -. E a se acostumarem com a situação.
Richelle Mead – autora norte-americana, conhecida por escrever os sucessos “Laços de Sangue (Bloodlines)” e “Academia de Vampiros (Vampire Academy)”. Série de livros que teve seu primeiro volume adaptado para o cinema em 2014. -, em sua mais recente trilogia, “A Corte de Luz (The Glittering Court), cria um universo, onde essas imposições e esse ambiente proibitivo, até um tanto hostil, em relação as mulheres ainda estão fortemente agregados aos hábitos sociais. E onde elas, mesmo que através de pequenas ações e com poucas escolhas, precisam lutar contra eles.
“Jamais planejei roubar a vida de outra pessoa.” começa narrando Elizabeth, condessa de Rothford. Uma jovem órfã, que vive com a avó desde a morte dos pais e está condenada a se casar com seu primo, um comerciante de cevada, por conta de sua eminente falência. E que para fugir de tal destino, precisa tomar a identidade de uma de suas acompanhantes, Adelaide, e seguir a caminho de uma nova vida na corte de luz.
A corte de luz recruta jovens das mais baixas camadas sociais e as transforma em damas, e futuras esposas da “nova nobreza” – um grupo formado por homens que se tornaram bem sucedidos e ricos, em Adoria -. Elizabeth, agora conhecida como Adelaide, faz parte da corte, assim como Mira e Tamsin – duas jovens que chegaram a Blue Spring junto a ela e vieram a se tornar suas amigas -, e se sai bem nas atividades da escola, até que uma forte atração por Cedric, filho do dono do lugar, pode colocar seu disfarce e o futuro, minuciosamente, planejado pela condessa, em risco.
O primeiro volume da nova trilogia de Richelle Mead, denominado A Corte de Luz, assim como a série, não é impressionante. Ele agrada aos leitores, principalmente aqueles já familiarizados à outras obras da autora, e proporciona um momento de boa leitura, mas narrativamente, não faz muito mais.
Com uma escrita fluída, curtos capítulos, personagens cativantes e uma história que desperta curiosidade, a autora cria um conjunto harmonioso, mas que não funciona a todo momento. As reviravoltas, apesar de levarem ao encaixe desse grande quebra cabeça, são tão constantes que deixam de cumprir com seu papel dentro da trama. Elas se tornam previsíveis, e aquele sentimento de instiga, que geralmente é despertado dentro do leitor e o leva com ânsia ao próximo capítulo, acaba por esmaecer.
No entanto, existem elementos que dão um maior valor a essa obra que deixa um pouco a desejar. Como por exemplo, a reflexão deixada por Mead, dentro do enredo e do período em que esse se passa. Ela recria o tempo presente na trama de uma forma tão realística, que o machismo e as convenções as quais a sociedade era apegada na época, incomoda quase que de forma física.
Richelle Mead, fala de empoderamento através de um diálogo entre duas épocas com significados bastante divergentes para o tema. Mostrando mulheres que viviam, diariamente, o machismo e desconheciam a prática de empoderar-se, para outras. Mulheres que, diferente do primeiro grupo, vivem para a prática e para o fim das sociedades machistas.
A autora, traz uma abordagem mais agressiva, destacando na sociedade da trama, as características do machismo que mais causam desconforto nas mulheres, o que poderia, se mal executado, ser confundido com falta de informação e até, como uma atitude machista por parte dela. E consequentemente resultar em interferência na comunicação da escrito com seus leitores, mas não aconteceu.
O novo livro da autora de Academia de Vampiro, não é um daqueles que, narrativamente, te tiram o fôlego, mas com certeza a reflexão presente traz todo um novo olhar para ele. Richelle Mead, transformou sua obra e todas as limitações que as mulheres vivem no período em uma lição para mostrar que de pequenas atitudes e de escolhas, mesmo quando elas parecem pouco significativas, são feitas as revoluções.
Mas infelizmente, com uma boa discussão em segundo plano e menor evidência, o livro não se destaca. Seus personagens são cativantes e prendem a atenção dos leitores, no entanto, não causam forte identificação com a atualidade, assim como algumas das situações onde os problemas e sentimentos, que poderiam trazer isso para a história, também não o fazem.
Vale a pena a leitura, desde que você esteja procurando fazê-lo por lazer, sem grandes expectativas ou em busca de obras que mexam com a sua mente, porque o romance, mais uma vez, foi colocado como prioridade e, insuficiente, para causar a impressão necessária para fazer de “A Corte de Luz”, marcante. E mesmo que não haja nenhum problema com o bom e velho romance, não é sempre que ele cabe como uma luva em primeiro plano.
A CORTE DE LUZ
AUTORA Richelle Mead;
TRADUÇÃO Andréia Barboza;
EDITORA Planeta Livros;
ANO 2017
PREÇO 27 reais.