Um Completo Desconhecido, cinebiografia sobre o início da carreira de Bob Dylan, chega aos cinemas brasileiros nesta quinta-feira, dia 27 de fevereiro. Dirigido por James Mangold (Logan), o longa traz um olhar enigmático sobre o artista em seus primeiros anos no cenário folk e sua consequente mudança de estilo. O elenco conta com Timothée Chalamet, Elle Fanning e Edward Norton.
As cinebiografias possuem grande apelo no Oscar, de modo que Um Completo Desconhecido não passou despercebido e acabou recebendo oito indicações ao Oscar, dentre elas Melhor Filme e Melhor Ator. Mas, apesar de cativante, a aposta na narrativa de perpetuar a aura misteriosa do cantor é justamente seu maior contraponto.
Ascensão de um completo desconhecido
Em meio ao fervilhante cenário musical da década de 60, Um Completo Desconhecido narra o início da carreira de um dos artistas mais influentes da música contemporânea. Bob Dylan, um jovem de 19 anos vindo de Minnesota, chega a Nova York em uma jornada de ascensão. O longa mostra seus primeiros passos no folk intimista e sua transição para os grandes palcos.
Carregando nada além de seu violão, Bob Dylan chega à Nova York com o objetivo de encontrar seu ídolo Woody Guthrie, que está internado por conta de uma doença degenerativa. Quando vai visitá-lo, para mostrar uma canção que compôs em sua homenagem, Pete Seeger, amigo de Guthrie, se impressiona com o talento d Dylan e o acolhe. Assim se inicia sua jornada no cenário folk da cidade.
Um Completo Desconhecido escolhe objetividade em vez de aprofundamento
Ao optar pelo recorte de um momento da vida de Dylan, Um Completo Desconhecido ganha em objetividade, mas perde em aprofundamento. O que não causa necessariamente um distanciamento, mas não permite o espectador ir além do que é posto em tela. Sim, é uma característica do cantor ser mesmo essa persona misteriosa. Mas penso que a trama só se beneficiaria ao se aprofundar e revelar mais das nuances de sua personalidade.

Por outro lado, a imagética de “lenda viva” de Bob Dylan é amplamente reforçada aqui. Como se ele pertencesse ao todo e a lugar nenhum ao mesmo tempo. Como se transitasse em uma dimensão criativa particular. E talvez seja esse o ponto mais cativante de Um Completo Desconhecido. A mística por trás do artista. A névoa que cobre o passado e se estende para os pontos menos interessantes dessa jornada.
Uma escolha narrativa corajosa, que se interessa mais em contar o que aconteceu e não porque aconteceu. Que não se preocupa se o público quer saber mais sobre a vida fora dos holofotes de Dylan do que de sua música. E nesse ponto ele se mantém fiel à personalidade do protagonista da história. Nada mais “Bob Dyliano” que mostrar apenas o que quer, quando quer e como quer. Por isso, apesar da frustração diante da falta de aprofundamento das personagens, consegui tirar proveito do que vi.
O brilho de Chalamet e a sombra dos coadjuvantes
A indicação para o prêmio de melhor atuação de Timothée Chalamet (Duna – Parte 2) é totalmente justificada quando vemos sua performance como Dylan. O ator consegue capturar todos os maneirismos e a personalidade blasé do músico. Isso sem contar com o trabalho de voz de Chalamet, que cantou sem dublagem e ainda se atentou ao tom de voz arrastado do músico. Certamente uma performance que merece reconhecimento.
Porém, a escolha narrativa de Um Completo Desconhecido acaba prejudicando o restante do elenco. Sylvie Russo, interpretada por Elle Fanning (Malévola), tem a profundidade de um pires, girando em torno das ações de Dylan e servindo apenas para reforçar a imagem mítica do astro. O mesmo vale para Joan Baez, vivida por Monica Barbaro (Top Gun: Maverick). Elas estão sempre à sombra o excentricismo de Dylan, tendo vida somente quando estão em tela.
Pete Seeger, interpretado por Edward Norton (Asteroid City), é o único coadjuvante que tem um pouco mais de substância. Norton está muito bem no papel, com uma interpretação suave, que, apesar de calma, consegue transparecer bem surpresa, orgulho e decepção. Sendo o ponto de tensão direta na narrativa, Seeger representa todo o público que se sentiu traído pela transição de gênero musical de Dylan.
Bob Dylan sob o olhar de Mangold
James Mangold consegue criar uma narrativa que reflete diretamente a aura de mistério de Bob Dylan. Com olhar acurado, Mangold recria uma Nova York da década de 60, que se agita entre a tradição e o inovador. Apesar de não ser revolucionária, a direção explora ao máximo o potencial de Chalamet, o que rende ótimas sequências.
Um Completo Desconhecido é excelente, mesmo incompleto
Tão enigmático quando seu protagonista, Um Completo Desconhecido é agradável de assistir. As apresentações musicais são excelentes e se integram bem à narrativa, sem deixar aquela sensação de interrupção. Mas para aqueles que esperam um filme que se aprofunde nas relações, motivações e até desmistifique um pouco o Bob Dylan, talvez deixe a desejar. É excelente, ainda que mantenha um véu erguido entre o público e a verdade.
Um Completo Desconhecido estreia dia 27 de fevereiro, somente nos cinemas.
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