Conlang | Um imenso prazer nerd

Alguém já ouviu falar de Conlang? Esta palavra pode ser um pouco desconhecida, mas sem dúvidas você, nerd, conhece do que se trata.
Conlang é o termo usado para “constructed languages” (línguas construídas) e se trata de uma língua artificial como o Klingon, Esperanto, Lojban, Quenia, Sindarin, Na’vi, Dothraki, etc. Parece complicado, mas de forma alguma está longe de nosso alcance.

Conheci conlang quando me adentrei pelo universo de o Senhor dos anéis e ali percebi uma língua artificial absurdamente detalhada. Logo depois descobri que para este universo no qual se passa os filmes, JRR Tolkien criou nada mais nada menos do que quatorze línguas, sendo que duas destas línguas estão tão bem estruturadas que podem ser aprendidas em cursos disponíveis na internet e em livros. Lá fui eu aprender quenya…

Depois de estudar quenya por um tempo, me interessei em estudar o desenvolvimento de uma língua artificial e dei uma olhada por cima de tudo, mas começei com conlang de fato quando precisei de uma “naming language” (língua nominal) para me ajudar no roteiro de um game. Naming Language é um termo chamado para línguas que são criadas para uso mais simples . Neste caso eu precisava de nomes de pessoas e lugares e poucas frases de uma maneira coesa, para isso, é necessário estudar um pouco de sons, morfologia, sintaxe, mas não há necessidade de estruturar uma completa conlang com todas possíveis regras gramaticais, tempos verbais, sistema de escrita, semântica, etc.

Muitas pessoas conhecem conlang através de filmes, séries, livros e logo querem aprender a sair falando… Indo mais além, um conlanger quer desenvolver sua própria língua, ou para uma demanda, ou por um puro e simples hobby. No meu caso é tudo isso junto : P

Vou mostrar um exemplo famoso de “naming language” que é a Black Speech (língua negra) do universo do “Tiu” Tolkien,que  Sauron usou para a inscrição no Um anel, sendo que a escrita chama-se Tengwar e é usada também para o sindarin e o quenya (o black speech veio do quenya). Este é um dos poucos fragmentos criados nesta língua e aparece nos filmes entoado por Sauron muitas vezes no plano de fundo e pelo Gandalf em Valfenda na versão estendida que você pode conferir no vídeo abaixo:

No anel Lê-se:

Ash nazg durbatulûk, ash nazg gimbatul,
Ash nazg thrakatulûk agh burzum-ishi krimpatul.

Traduzindo para o português, estas palavras formam:

Um anel para todos governar, um anel para encontrá-los,
Um anel para a todos trazer e na escuridão aprisioná-los.

Mesmo curto, este texto nos deixa entender bastante sobre a gramática da Black Speech. Bora fazer uma análise.

  • Nota-se muitas sílabas fechadas (terminadas com uma consoante).
  • Muitas pausas. Dá para notar bem em contraste com o Sindarin que é bem fluído, como a palavra Lothlórien…)
  • O final da palavra -zg e bastante uso de paradas vocais com o k, t e r dão um Tom “alien” para a língua.

E os significados?

ash nazg         –     um anel

durbatulûk      –     para todos governar

ash nazg         –     um anel

gimbatul         –     para encontrá-los

ash nazg         –     um anel

thrakatulûk     –     para todos trazer

agh                 –     e

burzum-ishi     –     na escuridão

krimpatul        –     aprisioná-los

Vamos dar uma olhada nos verbos (deixei acima em negrito). Todos eles estão no infinitivo e os dois que contém “todos” possuem um final similar -atulûk. Os outros dois  que dizem respeito a “eles” (nosso final -los) possuem apenas a terminação -atul. Já que essas palavras estão no infinitivo é possível que, assim como no inglês, a Black Speach também indique infinitivos, neste caso com o -at. Vamos imaginar que sim, então já dá para descrever um pouco da morfologia:

-at-   –   indicador de infinitivo
-ul-    –   diz respeito à eles
-ûk-   –   todos

Fora os verbos e as frases simples com o anel, nos resta apenas burzum-ishi… Pegando uma palavra de fora, a chamada “Fortaleza Negra” de Sauron, indicada como Lugbúrz, dá para saber que burz significa negro e -um é um nominalizador abstrato, neste caso transforma o negro em negridão / escuridão. Então -ishi significa “na”, que podemos chamar de posposição ao invés de preposição, já que aparece depois do pronome.

Colocando tudo junto, podemos formar uma gramática que fica mais ou menos assim:

SONS

Consoantes: b  t  d  k  g  sh  th  m  n  r  l …

Vogais: i  a  u  û …

MORFOLOGIA (estrutura das palavras)

– at –   infinitivo

-ul-     diz respeito à eles

-ûk-    todos

-um    nominalizador abstrato

SINTAXE (estrutura das frases)

  1. Numeral antes dos pronomes
  2. Adjetivos depois dos pronomes
  3. Posposições
  4. Sujeito antes do verbo

LEXICON (dicionário de tradução)

agh      e

ash       um

burz      negro / escuro

durb–     governar

gimb-     encontrar

ishi        no / na

krimp-    aprisinoar

lug         torre

nazg       anel

thrak-     trazer

A partir deste pequeno estudo, daria para continuarmos a escrever em Black Speech de uma maneira coesa, como fizeram para O Hobbit, que possue falas em Black Speech feita por um grupo de linguistas.

Se vocês estiverem desenvolvendo uma naming language, eu recomento vocês fazerem uma mini gramática como esta para deixar a sonoridade e escrita mais coesa mesmo não havento tanto material criado.

Quando eu assisti o filme Avatar, em poucos segundos eu sabia que o Na’vi tinha sido minuciosamente criado.

conlang_novonerd_avatar

Logo depois do filme eu pesquisei e enviei um mail para o criador da Língua, Paul Frommer, perguntando onde eu poderia obter material para estudar o Na’vi. Eu não tinha pretensão nenhuma de obter resposta, mas ele me enviou sim um e-mail falando de alguns lugares de confiança com os materiais dele e de seus ajudantes. Paul Frommer desenvolveu uma língua inteira e uma obra de arte, que já está sendo falada por muita gente. Para criá-la, ele precisou apenas de poucas palavras enviadas pelo James Cameron e começou com uma mini gramática não muito diferente desta feita acima.

Se Hergé (criador do Tim Tim) tivesse feito esse pequeno estudo para sua língua Syldavian, ela hoje não seria um exemplo de má conlang, pois ele montou a língua aos pedaços conforme ele foi precisando, impossibilitando uma gramática coesa.

Aprender uma conlang é um imenso prazer nerd e desenvolvê-la pode ser mais prazeroso ainda quando ela toma forma a ponto de começar a traduzir textos e ao encontrar soluções que aparecem no desenrolar dela. Há livros, sites e grupos de estudos sobre conlang que nos dão uma excelente direção se quisermos enveredar por este caminho.

Em um futuro post, falarei novamente de conlang, mas voltado para as obras do “Tiu” Tolkien, um dos grandes nomes no mundo das Conlang.

Na lû egovaned vîn.

Nerd: Universo 42

O projeto e a paixão de uma equipe de Nerds que gosta tanto de suas esquisitices que não consegue se conter. Afie sua espada, prepare seu golpe poderoso, pegue seus power converters e embarque nesta estrada, porque, meus amigos, “it´s gonna be Legen… wait for it… DARY! LEGENDARY!” - SO SAY WE ALL.

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