Estamos em um mundo tão polarizado e intolerante, sobretudo nas redes sociais, que rever A Outra História Americana, este filmaço do ano de 1998, o faz parecer mais como um documentário do que com um filme de ficção: é impressionante como o que é visto e dito no filme é igualmente dito nas redes sociais e nas mesas de bar como se fosse algo normal ou corriqueiro.
Se hoje em dia um número considerável de pessoas usa argumentos xenofóbicos contra refugiados, promove a separação dos estados do Brasil e até governantes tratam estrangeiros com desdém, aqui no filme (e também em um passado que insiste em voltar) alguns personagens, inclusive o protagonista, pregam discursos de ódio contra as classes menos favorecidas e promovem a ascensão da raça ariana.
Segundo os personagens, os negros e imigrantes são responsáveis pelo desemprego e decadência de seu país, e merecem ser exterminados o quanto antes. E é basicamente isso que vemos em A Outra História Americana, este filme muito à frente do seu tempo, o melhor papel da carreira de Edward Norton (que absurdamente perdeu o Oscar para Roberto Benigni por A Vida é Bela, que também é um grande filme, mas não dá para comparar as atuações) e impossível de terminar de ver e ficar indiferente.
Portanto, A Outra História Americana não é um filme para todos, não é um produto de entretenimento e recomenda-se assistir em um dia bom: são 120 minutos de soco no estômago.
O filme conta a história de Derek, papel de Norton, um líder neonazista de um bairro intolerante, que prega discursos de ódio com seus amigos, namorada e família. Logo no começo do filme, ele está transando com sua namorada e seu irmão, Danny, papel de Edward Furlong, o alerta sobre um roubo ao seu carro. São 3 jovens negros que atacam o carro de Derek, que assassina os três, mas é preso.
Há um salto temporal e Derek sai da prisão. Neste meio tempo, Danny se torna adepto à prática nazista o que provoca a rejeição de seu irmão. Mas, afinal, o que aconteceu para que Derek mudasse de forma tão radical?
Embora seja um filme para poucos, A Outra História Americana é perfeito em todos os sentidos: as atuações são impecáveis, não somente Edward Norton, mas Edward Furlong (o John Connor de O Exterminador do Futuro 2) também, além de todo o elenco coadjuvante.
Tecnicamente o filme também é perfeito: a montagem de Gerald B. Greenberg (que venceu o Oscar por Operação França) é rápida, urgente, realista, e contribui com o tom violento do filme, além da elegância e fluidez na transição de presente e flashback.
A fotografia de Tony Kaye (que também é o diretor do filme!) é mais do que perfeita, pois nas cenas no presente, há um bom uso de cores que intercalam entre o frio e o pessimista. Já os flashbacks são apresentados em preto-e-branco, o que dá ainda mais vivacidade e tensão ao filme.
A Outra História Americana é dos filmes que mais envelheceram bem e se tornaram relevantes, merece ser descoberto pelo público atual, porque é uma grande obra e para que seu tema seja discutido. As plataformas de streaming, como Netflix e Amazon, deveriam disponibilizar para torná-lo acessível. Escolas e faculdades também deveriam exibir e discutir com seus alunos.
Um filme poderoso como esse não pode cair no esquecimento.