Vivemos a época ideal para quem cresceu lendo quadrinhos. Ver seus heróis em filmes – bons ou não -, em carne e osso, muitas vezes sendo perfeitamente atuados, é de acalentar o coração de jovens e adultos que, possivelmente, cresceram com esses ídolos em mente. Todavia, é sempre importante pensar no seguinte aspecto: O que os super-heróis representam? Seriam meramente personagens fantasiados, cujo únicos propósitos são diversão e vendas? A resposta é incrivelmente simples, e até previsível… Não, não são somente personagens irreais. Talvez sejam uma das mais próximas representações do ser humano.
Dizer que o Homem-Aranha não é um exemplo perfeito para um adolescente que começa a ganhar responsabilidades e os deveres da vida pré-adulta é jogar fora a mais pura essência do personagem e o que ele pode representar para alguém que está passando por essa fase. Cada herói tem alguma mensagem para passar, desde o nível mais básico até níveis mais filosóficos e profundos, com direito a estudos de o quanto Kant inspirou Superman. Para alguns, o amigo da vizinhança ou o escoteiro não são suficientes para uma representação completa – não só isso, ambos tendem a apresentar um lado muito específico do que é a humanidade. Para muitos, a melhor persona para representar a humanidade sempre será o vigilante de Gotham, e para Paul Dini, o Batman tem uma representação muito além do que um homem que se traja de morcego.
Paul Dini, para quem não o conheçe, é produtor e roteirista de muitas animações da Warner, como Tiny Toons, Superman: The Animated Series, Batman Beyond, Duck Dodgers e o tão aclamado Batman: The Animated Series, sendo ele o criador da tão amada Arlequina. Mas quem vê um senhor já de idade com um aspecto tão simpático e agradável mal sabe o que passou pela sua vida, pegando fãs e admiradores de seu trabalho de surpresa, cabendo a ele mesmo, junto com Eduardo Risso, escrever The Dark Night: A True Batman Story, publicado pela Vertigo e ainda não traduzido pela Panini (patrocina nóis, Panini!). Pode soar estranho, afinal, o que Bruce Wayne, um personagem irreal, tem a ver com a história de um roteirista de desenho? Tudo não passa de uma forma muito intensa de passar significados tão únicos ao próprio morcego e seus vilões.
Narrando os eventos desde sua infância até um assalto violento, acompanhamos a vida de Paul Dini, uma criança que encontrou em seus ídolos uma forma de suportar suas constantes humilhações e como sua imaginação conduziu-o até a Warner Bros para criar animações, passando por sua vida amorosa conturbada e indo direto para seus problemas com bebida, além do trauma do assalto que o levou para caminhos estranhos. Todavia, presente a ele, havia personagens imaginários extremamente importantes, agindo com diversas facetas de sua própria consciência. Batman, simbolizando o ‘’anjinho’’, aquele que tenta guiar Paul para continuar sua vida, produzir mais desenhos, trabalhar e tentar superar seus traumas. Do outro lado, o próprio Coringa, no papel de ‘’diabinho’’, conduzindo ele a procrastinação, desleixo consigo mesmo e outros tantos vícios, contando também com a Hera Venenosa, Arlequina, Pinguim e outros, cada um com um aspecto diferentes de uma única pessoa, retratadas de forma tão lírica e poética.
A história é espetacular, o próprio Paul te conduz através dela e, mesmo evitando entrar em alguns assuntos que desviariam do assunto principal, ainda é muito sóbrio no que lhe conta e muito maduro, cabendo a ele mesmo fazer críticas ao seu eu passado, reconhecendo seus erros, falando diretamente com o leitor, criando um vínculo muito forte de empatia por aquele homem que, mesmo com bom humor, ainda não deixa de contar uma história pesada e extremamente triste. Porém, não deixa de ser uma fonte de extrema inspiração para qualquer um que esteja passando por uma fase difícil. Paul conseguiu, de forma acidental, tornar a história dele uma forma de mostrar às pessoas como ele mesmo, tendo como apoio seu próprio herói de infância, superar seus traumas e vícios.
A arte de Eduardo Risso é extremamente bem trabalhada e bem feita. Particularmente, seus desenhos na graphic novel 100 Balas são extremamente caracturados, tornando difícil uma boa apreciação de sua arte, mas em The Dark Night tem um zelo nunca antes visto: cada quadro é bem feito e bem desenhado, um trabalho impecável que merece atenção e não desvia a atenção do leitor, ajudando-o conforme o enredo é apresentado, até tendo uma sequência de desenhos no estilo Looney Tunes tão bonita que parece ser realmente do próprio estúdio.
The Dark Night mostra uma faceta diferente de um único homem, lidando com problemas extremamente reais, muitas vezes levando à mais pura desolação. Mas sempre existem aqueles que encontram uma inspiração pra continuar seguindo em frente. É tocante ver que, para alguém, um super-herói foi uma inspiração tão poderosa para combater seus próprios demônios internos, e é por isso que essa mídia, esse personagens fictícios são tão necessários e tão queridos, por muitas vezes serem capazes de refletir nossos piores momentos e demonstrar para nós, pessoas reais, como transcender isso e superar cada problema que a vida joga, seja um assalto traumático, uma depressão, uma apatia ou a ansiedade.
Com um enredo tocante e empático, uma arte maravilhosa e, particularmente, um crossover maravilhoso de Batman e Sandman nas animações que nunca aconteceu, mas aqui servindo para reforçar a imagem do Cavaleiro das Trevas, The Dark Night: A True Batman Story é uma história não sobre viver, mas como viver após tragédias, sobre como uma criança invisível encontrou em um mascarado sua maior inspiração e como isso é a realidade de muitos. Uma HQ não só recomendada, como obrigatória para qualquer um, independente de qualquer coisa.
Deshi Basara, nerds.
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